Por Leozito Coelho

7 de abril de 2010

Reality Show

A potranca está malhando na sala de ginástica do prédio. O prédio tem oito câmeras instaladas em locais estratégicos. As imagens vêm para o monitor da guarita. Eu trabalho na guarita. O Zé está aqui comigo. Ele é o faz-tudo do condomínio. No edifício moram aposentados e recém-casados. A potranca é a única solteira. Chegou faz três semanas. Chama-se Jussara. A gente gosta de ver a Jussara pelo monitor. Ela exercita os glúteos com pesos nos tornozelos. Zé silencia quando ela fica de quatro no colchonete. Jussara joga os pés para o alto. Uma perna, depois a outra. Zé bufa, limpa o suor da testa. Senta aí Zé, sossega um pouco, pensa na igreja. Ele diz que bunda assim não tem na igreja. Zé é sozinho, sem família nem mulher. Só tem a igreja. Eu semeei a igreja na vida dele. Lucimara minha esposa fez o mesmo comigo.

Mas Zé não está mais entre nós.
Porque ele, Zé, nunca mais foi visto:

Manhã chuvosa. Zé sobe para consertar o chuveiro do apê de Jussara. O reparo dura mais de uma hora. Jussara interfona no dia seguinte, bem cedo. Necessita de outro serviço. Um trabalho para o negão faz-tudo. O negão volta à casa da potranca, agora para desentupir o tanque. Ele passa duas horas lá. Zé muda daí em diante. Não vem mais conferir a chapa quente da Jussara pelo monitor. Some da igreja, corta relações com o Senhor. Foge de mim quando pergunto o que se passa. Foge como se eu fosse um ninguém. O ninguém que lhe deu alternativa na vida.

Zé, pobre Zé.
Porque Zé, subitamente acanhado, nunca mais foi visto:

Zé continua subindo ao apê da potranca. Zé troca as lâmpadas, fura paredes, instala cortinas. Em uma tarde de sol, Jussara aparece na guarita. Preciso do Zé, um lustre está quase caindo do teto, viu ele por aí? Zé surge na portaria, fardado de negão faz-tudo. Os dois tomam o elevador de serviço. Eles se pegam assim que a porta fecha. Jussara afunda o braço no macacão do Zé. O Zé desce o short da Jussara. Jussara escancara as coxas. Do meio delas surge algo. Eu me aproximo do monitor. Quase encosto o nariz na tela para ver melhor aquilo. Só então me certifico, trata-se de um pênis. Mais um no cubículo. Zé segura o dela e ela segura o dele. Os dois saltam do elevador.

Larga a mão do Senhor para se segurar naquilo? Ah Zé.
Porque Zé, já desabrochando, nunca mais foi visto:

Na mesma hora aviso o síndico do troca-troca no elevador. O síndico aciona a empresa que administra o edifício. O Zé é demitido por justa causa. Jussara se desculpa, mas é tarde. O proprietário requer o apê. Não admito que um espaço que já foi o meu lar seja ocupado por um, por uma, por esse negócio aí que vocês estão falando. Jussara se muda semanas depois.

Nunca mais vi o Zé. Nem a Jussara.

Tem sido difícil apagar a imagem da cabeça. O Zé afofando a vareta do Luís Eugênio no elevador. Luís Eugênio é o portador da bunda que a gente tanto admirava pelo monitor. Bunda que não tem na igreja. Aqui na igreja tem muita bunda como a da Lucimara. Coisa de elefoa esperando elefantinho. Mas ela não está nem aí, sacoleja o corpanzil assim mesmo. Lucimara salta, canta e louva ao Senhor com os braços erguidos. O Senhor que tudo sente, tudo sabe, tudo vê – ela repete com fúria. Ninguém escapa aos olhos dele.

Ninguém.


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7 comentários:

Rodrigo Rocha disse...

Ótimo Leo, bacana mesmo... hahaha!!!. O Zé é um tremendo baitola. hahaha!!!
Abraços,

jornalaico disse...

Eu ri no final, ri de gargalhar, quer melhor comentário? Um estilo é tudo. Os curtos estão ficando maiores. Blog de cara nova. Abraços.

Kaukal disse...

O bom e velho Leozito de volta em ótima forma!!!

Kaukal disse...

O bom e velho Leozito de volta em ótima forma!!!

Flávia Tavares disse...

hahaha! Adorei! Não esperava que Zé fosse A Zé e a Jussara O Luís Eugênio. Quanta criatividade...Muito bom!

Célia disse...

Leo, faz tempo que li seu texto. É o máximo. Sugiro divulgação especial no Vaticano, eles vão adorar.
Prazer ler o seu trabalho.
Célia

Carlota Joaquina disse...

KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK snif, snif, snif, snif, snif, kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk, snif, snif, snif, kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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