Por Leozito Coelho

14 de julho de 2009

Entrevistando Partícipe Jones

Difícil, talvez impossível. Partícipe Jones não se resume: explica-se. Um tempo curto demais. Demais pra mim. Mas eu tento, é aquela coisa do brasileiro, do babaca que não desiste nunca. Aliás, uma questão lógica: se ele não desiste é porque está sempre na merda. Na merda como eu, Partícipe Jones. Um solitário, mas feliz.


Dez minutos. Vamos lá. Não arrego.


Moro em um apê mínimo. Somente eu. Não há outro ser vivo naquele cubo. Ah, minto. Tem os lactobacilos. Pelo rótulo estão vivos. Mas na boa, duvido. Eu truco. Eu truco seis! Pra mim, quer saber? Pra mim eles já vêm mortos de fábrica. Pronto, é isso. Alguém por acaso já viu um nadando? Tô nem tchum. Nem tchum se esse bicho nada, flutua ou voa. Se é mesmo um bicho. Que porra é um lactobacilo? Ah, sinceridade. De modo que não é mentira. Sou apenas eu ali. Jones. Partícipe Jones. Espremido entre metros quadrados. Aquela coisa bem de pobre. Subsistência mesmo. Cozinho agachado, durmo na gaveta, bebo de canudo, leio estirado, estirado igual defunto, igualzinho ao lactobacilo, lá vem essa história, mas retomando, eu prego o livro no teto, com cola instantânea, aí dá leitura, sem problema.


Quanto tempo resta? Não me roube, doutora...


Mas eu me viro bem. Mesmo só. E ninguém está sozinho. Ah, minto. Na verdade estamos todos sós mas juntos, percebe? Olha, chama o Freud. Ele explica pra senhora. Psicografa. Manda um correio elegante. Sei lá. Nem sei mais o que disse. Ah sim. Eu me viro. E bem. Vou pinçando um prazer aqui outro ali. Sabe como é. Os vasos de parede, em banheiro de cervejaria. São cheios de gelo e limão. Adoro mijar naquilo. Não preciso de amigo. Ou de esposa. De ninguém. Troco tudo por umas três mijadas ali. Só pra ver o jato fervente estraçalhando os cubos. Ah, outra. Banho de lua. Eu me jogo na grama da praça e fico ali. Apenas de sunga. De paquera com a lua. Outro dia um mendigo me disse, tu vai ficar cinza. Quem sabe. A cidade já é cinza, num é? Nada de mais.


Certo. Três minutinhos. Preciosidade, né? O tempo.


Então. Mulher não tenho. Nem homem. Mas gosto de buraco. Não o jogo, dona. Digo buraco... buraco. Buraco pra socar a vara. Pronto. Desculpe mas é isso. Não sou de conversa ou conquista, beleza ou status, forma ou consistência, sou de buraco, ali eu me divirto. Ah serve. Se tiver buraco serve. Pra mim basta. Pode ser furo, fenda, racha, você decide. Se couber, tô dentro. Senhora, deixa eu te dizer. Amor é literatura. A realidade é o buraco. Jones. Partícipe Jones. Ponto final.


Minhas considerações. Certo.


Falo uma língua. A local. Para o futuro, morrer tarde. E só. Sim, tenho pós. Pó de guaraná, leite em pó, pó de café. Pós, ora. Ah, sou formado em porra nenhuma. O que faço da vida? Porra nenhuma. Estuda o quê? Porra nenhuma. E trabalha? Porra nenhuma. Qualquer dia invento essa faculdade. Capaz de ficar rico. Já imagino o anúncio: "Venha estudar porra nenhuma com a gente. Increva-se já! Vagas abertas." E, por fim, caráter. Nem bom nem mau. Nem sei se tenho. Onde se compra? Talvez alugue um com pedigree, quando a senhora me contratar. Quando contratar Jones, Partícipe Jones. Sou perfeito pra vaga. Nasci pra ela. Eu me encaixo nela como a um pau no buraco, de novo o buraco. Sempre o buraco. E é por isso que estou aqui.

Agradeço a oportunidade, senhora. Gentileza enviar a resposta por correio. Talvez eu ainda esteja lá quando a carta chegar. Só não garanto. Espero que dê sorte.

Muito prazer em conhecer.

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2 comentários:

Carlota Joaquina disse...

Então ele tá q nem a gente: temos um diploma que não vale porra nenhuma..........

Sandra Leite disse...

a-do-rei

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