Fui muito amigo do Mujico. Uma satisfação. Sou roto que dói, o dito vagabundo, mas estive próximo dele, acompanhei o drama. A imagem não dá trégua à cachola: ele morto, as donas ao lado, as velas acesas, a jagunça içando-lhe a calça. Mujico tava sempre ‘montado’.
A jagunça encheu-se na puberdade e não aliviou mais. Nem depois da vida. Após conhecer Mujico no bordel da Benedita, tentei ajudá-lo. Certa vez segurei a jagunça, apertei forte. Pra aterrorizar mesmo. Mas ela não retrocedeu um milímetro. Seguiu repleta apesar do gesto gay. Era indiferente ao gênero. Um fenômeno.
Quando Mujico afogou-a num balde de gelo, eu estava ao lado. Papeamos durante doze horas consecutivas à espera da moleza. Mas nada. Depois houve aquele fato polêmico. Fiz dois cortes na perna dele com a navalha do vô. Mujico sangrou bem, mas a jagunça manteve o prumo. O povo ficou irado. Não por causa dos ferimentos, mas pela lâmina utilizada. Era a mesma que barbeava a rapaziada no salão do vô. Doideira.
Certa época, concluíram que Mujico tinha de esvaziar. Recebi pessoalmente as fichas de inscrição das interessadas. Mais de cem. A praça parou para vê-lo traçar uma a uma, sem intervalo, sobre a mesinha do xadrez. Houve até aposta: “A jagunça tomba após a trigésima!”, “Ponho vinte mangos na octogésima!” ou “Pra mim ela não cai!”. E de fato não caiu. Maior pedregulho.
É o que digo: Mujico morreu de estresse. O pobre-coitado mal dormia com aquilo sempre em riste. Só sei que ele caminhava na rua principal quando subitamente levou a mão ao peito, envergou e caiu já defunto. Pude vê-lo estendido na maca. O lençol que lhe cobria o corpo tomara o formato de uma tenda. A jagunça era imortal.
No velório, o padre rezou de costas para Mujico. Convinha evitar o confronto visual com a jagunça. Santidade não combinava com aquilo. Quando o pároco disse “Que Deus o tenha, Murilo Jacó, e descanse em paz”, alguns riram contidamente. A jagunça não lhe dava folga nem no além.
Antes de fechar o caixão, senhoras da comunidade aproveitaram para tocar a jagunça, senti-la entre os dedos. Quanto a mim, preferi guardar distância. Estava desconsolado. Só intercedi quando quatorze quengas ameaçaram homenageá-lo com um orgasmo orquestrado. Pedi respeito ao sofrimento dos parentes. Elas abaixaram as saias, constrangidas.
Hoje faz dois anos que ele e a ‘duradoura’ partiram. Guardo no bolso a foto do noticiário da cidade. Ele pálido, finado; ela encoberta, e rija. Tenho saudades diárias do amigo. De sua jagunça encantadora. Daqueles tempos fantásticos que não voltam mais...
Por Leozito Coelho
24 de agosto de 2007
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Um comentário:
Humm delicioso. Me lembrou a fantástica história do Mojica, Zé do Caixão, que inventou um passado para ele mesmo, onde diz que ficou fascinado com o por morte depois de assitir um enterro, em uma cidade do interior, onde durante o velório o morto leantou. Fi um alvoroço e, depois o cara foi expulso da cidade por se tratar de um morto vivo, segundo o pessoal da cidade, na verdade ele era apenas vitima de catalepsia. Essa história é do Mojica, mas é mentira. òtima mentira são melhores que muitas verdades. Parabéns.
Anonima
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