Por Leozito Coelho

16 de dezembro de 2004

Papéis

No papel de narrador deste recito, digo que toda a labuta desesperada de anos e anos termina numa cova em que vermes esfomeados trabalham incessantemente, quando depois também morrerão e não precisarão ser enterrados, e sobre os quais ainda outros elementos vivos deverão empenhar seu trabalho e assim por diante, numa cadeia morta-e-viva subterrânea. Agora, o verdadeiro narrador deste recito, eu, venho analisar o pessimismo do narrador precedente como fuga, colocando no "fim das coisas" o peso que lhe permita escapar das necessidades prementes do dia-a-dia. Um covarde, posso dizer. E acrescento que a reprodução humana é o passo fundamantal para que a morte seja apenas um aspecto do processo ininterrupto da tradição familiar e da sucessão das gerações, o que emprega a todos os mortos o seu valor de perpetuador da espécie. Vou tomar uma cerveja e volto logo, ok? (...) Aproveitando a interrupção, eu, o narrador autêntico, pretendo terminar essa discussão tola mantida por outros dois narradores, pois somente eu, o real narrador, tenho o poder absoluto de colocar autoritariamente o ponto final.

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